terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

INTERFERÊNCIA DE EMISSORAS EM AERONAVES

A acusação Muito se tem falado sobre a interferência de sinais eletromagnéticos emitidos por emissoras "piratas" sobre outros sistemas de comunicação. Elas interfeririam na comunicação da torre de controle com as aeronaves, nos sistemas privados, nas centrais com ambulâncias e veículos da polícia. A Associação Brasileira de Emissoras de Radio e Televisão (ABERT), faz campanha sistemática contra tais emissoras alertando a população para o risco de acidentes e solicitando que denuncie sua existência. Segundo a ABERT, uma emissora clandestina de baixa potência pode provocar a queda de aviões. Isto é possível? O Coletivo de parlamentares petistas de comunicação comunitária no Congresso Nacional, por diversas vezes fez esta indagação ao antigo Ministério da Aeronáutica, hoje integrado ao Ministério da Defesa. As respostas, que antes vinham sob um formato técnico, agora chegam ideologizadas. Isto é, ao longo do tempo, houve um amadurecimento político nas respostas, até chegar hoje há um franco posicionamento do Governo contra as rádios comunitárias. A técnica Um aparelho transmissor emite ondas eletromagnéticas que são captadas por um aparelho de rádio. A emissão (ou transmissão) é feita em determinada freqüência de ondas. A freqüência caracteriza a transmissão como sendo de Onda Média (AM), Freqüência Modulada, Ondas Curtas (OC), Sons e imagens (televisão),... Além destes meios de comunicação mais popularizados, há, por exemplo, transmissores para a comunicação entre o sistema hospitalar e as ambulâncias, no policiamento, no sistema da marinha, fazendo a ligação da torre de controle do aeroporto e as aeronaves. Em suma, no ar existe um emaranhado de transmissões eletromagnéticas simultâneas. A confusão não se estabelece porque cada sistema de comunicação opera em faixas diferentes. Para sintonizar uma emissora AM, o interessado liga seu rádio comum e vai localiza-la na faixa precisa. Para sintonizar uma FM, deve procurar na faixa de 88 a 108 MHz (Mega Hertz). Os sinais de televisões também estão numa determinada faixa. Para captar os sinais de uma central de polícia a pessoa deve ter um aparelho especial que capte na faixa que ela transmite, digamos, em termos fictícios (porque é questão de segurança), acima de 500 MHz. Como cada um destes sistemas operam em faixas diferentes, a princípio não há possibilidade da pessoa captar no seu rádio comum uma conversa da central de polícia com o carro-patrulha, ou a comunicação entre dois barcos da marinha, ou simultaneamente uma FM e uma AM. Isto só ocorrerá se houver problemas na transmissão. Rádio FM As emissoras em Freqüência Modulada se disseminaram porque têm como vantagens: o baixo custo dos equipamentos e uma boa qualidade sonora. Comparando com uma transmissão de Ondas Médias (AM): a emissora AM tem maior alcance, mas perde na qualidade do sinal; a FM tem alcance menor, mas, como já se viu, consegue melhor qualidade sonora. FM se propaga em linha reta - isto é, se houver uma elevação do terreno ou construções à sua frente, o sinal perde a força. Dois elementos são fundamentais para entender a questão técnica: a freqüência e a potência da emissora. Freqüência, medida em Hertz, é, na verdade, uma identificação da propagação da onda eletromagnética. A faixa de Freqüência Modulada, FM, vai de 88 a 108 MHz - é o que está no dial dos aparelhos de rádio. Por isso não adianta montar uma emissora de rádio FM para transmitir em 110 MHz. Ninguém vai escutar esta rádio porque ela não está no dial. Agora eis o absurdo: o Governo, através da Anatel, anunciou que vai locar todas as RCs em 87,9 MHz, o canal 200 - fora do dial! Hoje já existem várias autorizadas a funcionar assim - vão transmitir para ninguém. O aumento ou diminuição da freqüência não altera o alcance. Potência é medida em Watts, e dá a medida da força do transmissor. A princípio (porque há outros elementos a se levar em conta), quanto maior a potência maior o alcance. As aeronaves Acima da faixa de FM, funciona o Serviço Móvel Aeronáutico, SMA, que é de uso exclusivo do sistema aeronáutico. O SMA vai de 108 a 132 MHz. Isto é: Faixas de transmissão: Rádios FM Aeronáutica MHz 88................................108.....................132 Rádios comunitárias As aeronaves utilizam uma faixa acima de 108 Mhz. Portanto, uma rádio que opere na sua faixa de FM, isto é de 88 a 108 Mhz, a princípio, não tem como interferir nos serviços da Aeronáutica. Na verdade, não é interessante para nenhuma rádio mandar um sinal que está fora da faixa de captação popular. Existe, porém, a possibilidade de um sinal de rádio FM ser captado acima de 108, por uma aeronave. É quando ocorrem "espúrios" ou "harmônicos". Harmônicos são clones de um sinal de rádio. Um exemplo fictício: se a rádio opera em 104 MHz, ela também pode ser ouvida em 106 Mhz e 107 MHz - é como se surgissem clones das rádios no dial. Todo transmissor vem com um filtro de harmônicos mas pelo menos três deles escapam. Os três, geralmente, são sinais fracos, que não causam problemas aos outros. Não causam problemas porque 1) geralmente se estabelece uma distância entre a faixa oficial de transmissão e as outras emissoras; 2) os sinais harmônicos são fracos; 3) os receptores têm filtros para harmônicos. Se um equipamento está desajustado, além de gerar harmônicos, gera espúrios. Os espúrios são os clones incontroláveis do sinal oficial. Então, ao invés de três harmônicos, a emissora gera uma dezena, sendo escutada em todo dial. Isto é mais difícil de ocorrer porque a própria fábrica que vende equipamentos de transmissão, em baixa ou alta potência, inclui os filtros necessários. Se o equipamento de transmissão está descalibrado, se é de má qualidade, a transmissão vai lançar espúrios para todo lado, e ir além de 108 MHz, onde funciona o serviço da aeronáutica. Não importa se é rádio comunitária ou comercial, se é clandestina ou legalizada, operando com equipamento descalibrado ela pode mandar sinais para o Sistema Móvel Aeronáutico. Como derrubar um avião A primeira faixa do Sistema Aeronáutico vai de 108 a 111,975 MHz - que corresponde ao serviço batizado como "Instrument Landing System" (ILS). O ILS é utilizado para comunicação entre a torre de controle e a aeronave, mas somente na descida e quando não há visibilidade. O que o piloto deve fazer quando, ao entrar em contato com a torre usando o ILS, perceber uma rádio interferindo na audição? Ora, o ILS previu problemas deste tipo e disponibiliza nesta faixa uma centena de canais contingenciais. Se houver interferências num canal, basta o piloto mudar para um dos outros 99 disponíveis. Ou seja, em virtude da enorme quantidade de canais disponíveis, a possibilidade de um piloto ficar sem comunicação com a torre neste instante é bastante remota. Existe ainda a possibilidade de interferências sobre o sistema de radionavegação das aeronaves. Sinais de orientação emitidos via rádio para as aeronaves podem ser misturados com os de uma emissora de rádio. Esta possibilidade também é remota porque os sistemas instalados nas torres de controle e também os que estão nas aeronaves vêem preparados para interferências deste tipo. Não há como conceber um sistema que requer extrema segurança e seja sensível a interferência de uma rádio de 25 watts. Em resumo As possibilidades de uma emissora - comunitária, comercial ou clandestina - interferir numa aeronave são: 1) estar instalada nas proximidades de um aeroporto; 2) operar nos extremos da faixa (perto de 88 ou de 108 MHz); 3) operar com equipamentos não ajustados; 4) atuar com potência elevada. A possibilidade de causar um acidente, porém, é remota. Primeiro, porque isto já foi previsto e, por isso, os equipamentos e os pilotos estão preparados para situações como esta. Segundo, se o sistema aeronáutico fosse tão frágil assim como faz crer a ABERT e o Ministério da Defesa, seria mais fácil (e barato) para um terrorista comprar um transmissor de 25 watts do que despachar uma bomba a bordo. Os acidentes oficiais No ano passado o Ministério da Defesa foi solicitado pelos deputados Walter Pinheiro, Henrique Fontana, Valdeci Oliveira e Adão Pretto, a relatar com precisão os acidentes que ocorreram com aeronaves devido a interferências por emissoras. A resposta veio vaga, imprecisa e ideologizada. Foram solicitadas "todas as ocorrências" e o que veio foi isto: I) "Interferência de rádios piratas na torre de controle de Guarulhos". II) Interferência da rádio FM Novo Tempo, de Nova Friburgo, Rio de Janeiro, torre de controle de Afonsos. III) Interferência de rádio pirata no bairro de Santana, São José dos Campos, no controle de aproximação e ILS IV) Interferência de emissora FM no sistema de pouso por instrumentos do aeroporto Afonso Pena, Curitiba V) Interferência de emissoras "broadcasting" informados por pilotos da aviação comercial nos aeroportos de Guarulhos e Santos Dumont." A resposta do MD revela que há emissoras comerciais ("broadcasting", como eles gostam de dizer) interferindo nos dois aeroportos de maior trânsito do país. São emissoras associadas da ABERT! Até a Televisão comercial (Canal 2 de Vitória, Espírito santo) está interferindo. Mas a ABERT, evidentemente, se cala sobre isto. A resposta do Ministério da Defesa mostra que são poucas as interferências causadas por emissoras clandestinas. E, confirma no texto: "até hoje não ocorreu nenhum acidente provocado por interferências de emissoras comunitárias ou piratas no SMA". O Ministério da Defesa revela, porém, sua discriminação: "existem vários registros de interferências causadas pelas rádios ditas comunitárias". O Órgão do Executivo comete uma ignorância cruel ao afirmar que as tais rádios comunitárias "deveriam funcionar unicamente na freqüência de 87,9 MHz (canal 200)". Ora, o Brasil inteiro sabe que a Abert/Anatel/Governo quer locar todas as comunitárias neste canal. Mas, por uma questão técnica teve que disponibilizar quase uma dezena de outros canais alternativos - oficialmente! - para as rádios comunitárias. O que queremos Nossa orientação às emissoras comunitárias é: VI) Operar em canais que estejam livres de outras emissoras, e distante da que vem a seguir no dial VII) Utilizar transmissores ajustados, calibrados, com filtros de harmônicos. VIII) Utilizar canais centrais no dial, longe das bordas de 88 e de 108 MHz, para evitar que os harmônicos atinjam outros sistemas. IX) Não se instalar próximo de aeroportos. O que não admitimos X) Uma legislação que estabelece um só canal de freqüência para todas as rádios do país. É por causa disso que muitas emissoras ocupam canais sem critérios. XI) A decisão governamental, insuflada pela Abert, de locar todas as RCs no canal 200, fora do dial. XII) O alcance de 1 Km para as rádios comunitárias. XIII) Que o Executivo - conforme a legislação - não atue quando uma emissora comercial interferir sobre uma rádio comunitária, mas puna a comunitária que interferir sobre os outros sistemas. XIV) Em resumo: a lei 9.612/98 e o Decreto 2615/98 Brasília, 07/08/01 Dioclécio Luz ass. dep. Walter Pinheiro

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